" - Não me venha com esse tom... - interveio tia Petúnia em voz estridente: contudo, Vernon Dursley acenou-lhe para que se calasse.
-Tudo não passa de conversa oca - disse o tio Vernon, fixando ferozmente em Harry os seus olhos de porquinho. - Não estou disposto a acreditar numa só palavra sequer. Ficamos onde estamos, não vamos a lado nenhum.
Harry ergueu o olhar para o tio e foi dominado por um misto de exasperação e divertimento. Nas últimas quatro semanas, Vernon Dursley mudara de ideias a cada vinte e quatro horas, fazendo e desfazendo as malas e arrumando-as e tirando-as do carro de todas as vezes. O momento predilecto de Harry ocorrera quando o tio Vernon, alheio ao facto de Dudley ter acrescentado os halteres às malas desde a última vez em que as desfizera, tentara içá-las mais uma vez para o porta-bagagens e se deixara abater por entre gemidos de dor e imprecações.
- Na tua opinião - afirmou Vermon Dudley nesse momento, recomeçando a calcorrear a sala - nós... a Petúnia, o Dudley e eu próprio... corremos perigo. Por culpa... por culpa...
- Por culpa da "minha gente", pois - completou Harry.
- Pois bem, eu não acredito nisso - insistiu o tio Vernon, detendo-se novamente diante de Harry. - Passei metade da noite acordado a remoer mais uma vez o assunto, e estou convencido de que não passa de uma tramóia para nos ficarem com a casa."
[Harry Potter e os Talimãs da Morte, de J. K. Rowling, Ed. Presença, versão portuguesa]
Ou assim?
"- Não venha com ironias... - começou tia Petúnia coma voz esganiçada, mas o marido fez sinal para que ela se calasse.
- É tudo conversa fiada - afirmou ele, encarando Harry com seus olhinhos de porco. - Conclui que não acredito em uma única palavra. Vamos ficar aqui, não vamos a lugar algum.
Harry ergueu os olhos para o tio e sentiu uma mescla de exasperação e surpresa. Válter Dursley vinha mudando de idéia a cada vinte e quatro horas nas últimas quatro semanas, carregando o carro, descarregando-o e recarregando a cada mudança. O momento favorito de Harry tinha sido quando o tio, sem saber que Duda guardara os pesos de musculação na mala desde a última vez que fora descarregada, tentara colocá-la novamente no porta-malas e desequilibrou-se, soltando urros de dor e xingando horrores.
- Pelo que me conta - disse Válter Dursley, recomeçando a andar pela sala -, nós Petúnia, Duda e eu, corremos perigo. Por conta de... de...
- Gente da "minha laia", certo.
- Pois eu não acredito - repetiu o tio, parando outra vez diante de Harry. - Passei metade da noite refletindo e acho que é uma armação para você ficar com a casa."
[Harry Potter e as Relíquias da Morte, de J. K. Rowling, Ed. Rocco, versão brasileira]
Na quinta feira passada, em Lisboa, falou-se do Acordo Ortográfico.
A opinião era unânime.
Não ao Acordo Ortográfico.
1 comentário:
A velha máxima italiana «tradutore, traditore» aplica-se às mil maravilhas a estas duas versões do Harry Potter. A J. K. Rowling, que viveu algum tempo entre nós, é que nos poderia dizer qual dos dois tradutores terá cometido menos traições ao texto original. Estou certo, contudo, que o seu parecer ignoraria por completo a questão do acordo ortográfico. Tradução e ortografia não são, de facto, «farinha do mesmo saco».
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