Em 1875, neste dia, surge publicada nas páginas de um jornal intitulado A Lanterna Mágica, uma singular figura que ainda hoje nos é familiar: o Zé Povinho.
No canto inferior esquerdo, uma assinatura: Rafael Bordalo Pinheiro.
Como nasce este Zé, que se torna figura conhecida, amada por uns, detestada por outros, mas nunca ignorada?
Tendo em atenção a data de publicação, véspera de 13 de Junho - dia de Santo António, santo bem-querido e casamenteiro - a cena passa-se num altar dedicado ao santo.
Em lugar de destaque, no cimo do altar (ou não fosse ele todo-poderoso) Fontes Pereira de Melo tendo ao colo um menino rei D. Luís I.
À esquerda, uma pouco amigável personagem, responsável das polícias, empunha um chicote disciplinador.
À nossa direita e em primeiro plano, um ministro da Fazenda orientador dos dinheiros nacionais, a pedir esmola a um homem incrédulo. Este, encavacado, coçando a cabeça num gesto incrédulo, é o Zé, que estende duas moedas tiradas de um bolso vazio sem fundo.
Em cenário, as moscas-políticos, que voam baixinho importunando tudo e todos.
Saudade
Era um dia de chuva e de céu pesado. Entra, sentindo-se pouco à vontade; coisa passageira...
Desde logo o computador não tem segredos para ele. Quente e aconchegador, torna-se de banal utilização.
A partir do momento em que gera uma certa empatia com o meio, passam a ser vários os seus locais de eleição.
Nos dias de sol, a montra. Sempre acarinhado por um ou dois romances de teor histórico; corre pelos becos e vielas do Último Cabalista de Lisboa; entranha-se nas páginas de Marguerite Yourcenar.
Nos dias de algum vento, aconchega-se ao Velho e o Mar, levado à bolina pelas palavras de Steinbeck.
Em momentos mais nostálgicos, procura na poesia o consolo para as suas tristezas. Folheia os amores de Florbela…
Chega a brincar com as fitas do vestido da queiroziana Maria Eduarda.
Em busca de afinidades, debruça-se sobre as páginas escritas por Luís Sepúlveda.
Vocacionado para a aventura, escolhe a companhia de John le Carré; com Tolkien conquista mundos imaginários.
Com Carl Sagan desvenda os mistérios do universo.
Acarinha Victorino de Almeida e Mia Couto.
O seu maior afecto vai, indiscutivelmente, para os livros de arte. Com particular incidência na pintura, impressionista, de preferência. Brinca com os nenúfares de Monet.
Trata os livros como o mais apaixonado dos bibliófilos. Acarinha-os sob o seu corpo, moldando-se a eles.
Uma vez por outra, fazendo jus ao nome, mostra as suas garras, e alguém sofre com a expressividade da sua natural rebeldia.
Vive e sonha entre prateleiras repletas de livros. É o que se pode dizer, com toda a propriedade, uma vida vivida entre grandes e muitos saberes!
Ele, o nosso gato livreiro, de nome Gil Vicente, que há um ano encerrou as páginas do livro da sua vida.
Hoje, ele é talvez a história de um livro por escrever...
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Comentários:
Luis Eme disse...
Que lindas homenagens ao nosso "Zé" e também ao Gil Vicente, um apreciador raro de boa literatura...
14 de Junho de 2007 1:11
1 comentário:
Que lindas homenagens ao nosso "Zé" e também ao Gil Vicente, um apreciador raro de boa literatura...
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