“O amor surge naquela existência como uma claridade súbita que vai iluminar tudo. Matricula-se na Academia de Belas Artes, matricula-se no Curso Superior de Letras. Estuda? Não sei. Em todo o caso faz caricaturas à ponta de charuto nas paredes desses mesmos estabelecimentos do Estado, e, os que as vêem, param, riem, vão chamar outros para rirem juntos, vão depois a ele para o abraçar…
- Magnífico!
- Magnífico!
- Tu é que fizeste isto?
- Está bem bom!
- Está bem bom!
- Faze lá este, faze lá aquele… Soberbo!
- És artista!...
E, como o coro antigo, ele principia a ouvir de todos os lados.
- Tens talento!...
Ah! Grande consolação dos que quase sempre são fadados para não terem nenhuma outra! Dessa mesma se desconfiará mais tarde: mas aos vinte anos, que doçura, que calor, que luz, que bem suavíssimo e balsâmico, que incitamento, que coragem dada nessas palavras:
- Tens talento!”
Prefácio de Júlio César Machado, in: Álbum de Caricaturas Frases e Anexins da Língua Portuguesa de Rafael Bordalo Pinheiro, 1876
Ah! Grande consolação dos que quase sempre são fadados para não terem nenhuma outra! Dessa mesma se desconfiará mais tarde: mas aos vinte anos, que doçura, que calor, que luz, que bem suavíssimo e balsâmico, que incitamento, que coragem dada nessas palavras:
- Tens talento!”
Prefácio de Júlio César Machado, in: Álbum de Caricaturas Frases e Anexins da Língua Portuguesa de Rafael Bordalo Pinheiro, 1876
Ao entardecer, uma grande tela de um branco baço, apoiada num candieiro da rua deserta, suscita a curiosidade.
Para que servirá? E quando a esta superfície se juntam mais três, também brancas e de consideráveis dimensões, agudiza-se a curiosidade. São dez da noite e contrastando com o negro do céu e o cinza do empedrado da rua estas extensões sem cor provocam a imaginação dos ainda raros passeantes.
Nada de misterioso se passa. Vai dar-se início a uma perfomance integrada na já tradicional Caldas Late Nigth levada a cabo pelos alunos da Escola Superior de Arte e Design, que todos os anos, por três dias do mês de Maio, descem à cidade e a transformam com as suas intervenções artísticas.
Para que servirá? E quando a esta superfície se juntam mais três, também brancas e de consideráveis dimensões, agudiza-se a curiosidade. São dez da noite e contrastando com o negro do céu e o cinza do empedrado da rua estas extensões sem cor provocam a imaginação dos ainda raros passeantes.
Nada de misterioso se passa. Vai dar-se início a uma perfomance integrada na já tradicional Caldas Late Nigth levada a cabo pelos alunos da Escola Superior de Arte e Design, que todos os anos, por três dias do mês de Maio, descem à cidade e a transformam com as suas intervenções artísticas.
O passeante depara com as mais variadas perfomances. Algumas, talvez a maior parte desinteressantes q.b., e um punhado delas de assinalável qualidade artística.
Mas deixemos a crítica para os críticos e voltemos à noite da última sexta feira.
Mas deixemos a crítica para os críticos e voltemos à noite da última sexta feira.
Na Rua Heróis da Grande Guerra em frente à Livraria, Rafael Bordalo Pinheiro regressa às Caldas da Rainha.
Regressa, recriado por um processo de intervenção artística, tida como contemporânea, mas tão antiga como a criatividade humana: o graffiti.
Nos placares começam a surgir os primeiros contornos em cores fortes de acordo com a personalidade do artista inspirador do tema.
Trabalho de minúcia, delicadamente contornado a mão certeira.
E ao longo das horas que se seguiram a obra ganhou forma, completada em quatro painéis, feitos de imaginação cor e talento.
Os noctívagos paravam, comentavam, tiravam fotografias.
Uns tantos, mais distraídos comentavam: aquele bigode é do Eça; outros, com mais sentido poético, auguravam: - Fernando Pessoa? Na pressa da passagem nem liam o nome desenhado a cores de fogo: Bordalo Pinheiro.
Na rua das Montras umas tantas caixas com a sinalética da Fábrica Bordalo Pinheiro convidavam o passeante à construção de puzzles interactivos. Play Box estabelecia uma surpreendente interacção com os que vadiavam pela arte.
Pelas três da manhã a obra foi dada por concluída. Diga-se em abono da verdade, que com muito custo; porque aos verdadeiros artistas falta sempre um último toque!
Apagam-se as luzes. Fecho a porta da Livraria no desejo sincero de a tornar a abrir sempre que for necessário dar apoio às intervenções de rua que dão vida à cidade.
Os meus parabéns e agradecimentos ao Nicola, ao Filipe e ao André por me terem dado a oportunidade de participar nesta acção evocativa do grande criativo que foi Mestre Rafael Bordalo Pinheiro.
Noto agora que num dos painéis, Bordalo Pinheiro de fidalguesta figura interroga-se: Modernices? Enquanto isso um Zé de mãos nuns bolsos (vazios ?) olha de revés para um dos ícones da modernidade (?) caldense.
Caldas Late Night
22 de Maio de 2009, Rua Heróis da Grande Guerra
3 comentários:
Um dos artistas sou eu..CriS
Obrigado pelo blog ;)
gostei bastante de passar de manhã pela tua rua, no sábado, Isabel...
claro que a chuva depois apareceu, mas valeu a arte de uma ponta a outra da rua das montras, enquanto deu...
A realidade cultural da Cidade onde nasci, vejo-a cada momento que passeio pelos blogues, Sinto-a em mim, hoje em liberdade expressão, o que não se passava no meu tempo…
Talvez seja realidade e não cumplicidade o comentário que dei no Blogue 100SentidoComSentido…
João Ramos Franco
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