PORTUGAL
MIGUEL TORGA
[...]Todas as condições, como se vê, para que outro apogeu da nossa cultura surgisse das margas onde ela afinal tem as raízes. Uma vez que o melhor da força criadora nacional está concentrado nesse pequeno reduto de que as serras de Aire, Candeeiros e Montejunto são ameias, nada de mais sensato do que tentar reverdecê-la aí. Granjeada de novo naquelas colinas suaves e calmas, talvez brotasse com o alento por que todos suspiram. Não é às lousas do xisto ou à aspereza das urgueiras que se hão-de pedir filigranas góticas e versos bucólicos. Nos sítios onde a natureza não quer, nem as calhandras cantam. O talento é preciso, mas é preciso também que o meio ajude. Que sustente o artista e lhe dê pedra capaz, barro moldável, madeira propícia, e lhe não tolha as mãos de frio, se ele escreve ou pinta. O faro, de resto, nunca enganou a fauna dos que em Portugal vivem condenados à inglória penitência da beleza. Porque sabem que é ali o clima ideal do seu trabalho, eles próprios consideram sempre a Estremadura como chão dos seus pés. Sem falar no Rodrigues Lobo, no Malhoa e no Lopes Vieira, que, por sorte, nasceram na região, é um Frei Agostinho da Cruz que se refugia na Arrábida, um Bordalo que deixa Lisboa e assenta arraiais nas Caldas, um Eça que, embora fugidiamente, se instala em Leiria, uma Josefa de Óbidos que procura a terra do pai, um Guilherme Filipe que se demora na Nazaré - fora os muitos e muitos que desejariam ficar, mas a quem a vida apenas consente curtas visitas de tonificação."
Centenário de Miguel Torga- O escritor nasceu a 12 de Agosto de 1907.
[Miguel Torga, Portugal - Publicações Dom Quixote, 7.ª Edição (1.ª na Dom Quixote), Junho de 2007. ISBN 978-972-20-3370-1]
1 comentário:
Bonita homenagem a Torga...
Um abraço
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