Cavacos das Caldas
CAVACOS DAS CALDAS II

DICIONÁRIO GRÁFICO BORDALIANO

alguns livros, cerâmicas, belos gatos e algo mais...



sexta-feira, 21 de março de 2008

266.ª Página Caldense


ÁLBUM DE MEMÓRIAS
JOSÉ HERMANO SARAIVA

"Dezembro, 6
(...) Foi esta a última festa que eu dei na pequena casa geminada com a casa do dr. Sá Machado. Convidei para isso principalmente jornalistas. Não podia servir num jantar de jardim, e à volta de uma pequena piscina, a louça do serviço da Companhia das Índias com marcadores de prata que servia na embaixada de S. Clemente. Para resolver o problema, voei para Lisboa, fui às Caldas da Rainha, e na Casa de Cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro encomendei três grandes caixotes com louça para uma refeição a que não podia chamar almoço nem jantar. Estávamos na altura de S. Martinho e resolvi introduzir o neologismo na língua brasileira: o Magusto. No Magusto o essencial eram as castanhas, a assar em pequenos fornilhos debaixo da terra, que os empregados da embaixada iam mantendo acesos. Tudo regado com dois ou três barris de vinho moscatel de Setúbal , que foram enviados directamente pela adega regional de Palmela. A louça era das Caldas, cerâmicas muito vistosas: as folhas de couve, os cachos de uva, toda aquela fantasia dezanoviana do Rafael Bordalo Pinheiro. A Maria de Lourdes insistia delicadamente, dizendo que a louça das Caldas não podia servir em caso nenhum numa embaixada. Mas o certo é que teve um êxito extraordinário. Os meus convidados faziam à saída, gentilmente, o elogio da louça, e pediam para levar uma recordação. Alguns levaram duas ou três recordações. Naturalmente cada um levou as que quis. Sempre que era possível, os empregados da embaixada lavavam a louça, que estava servida, embrulhavam-na e entregavam-na a quem pedia. Mas muitos nem sequer pediam: metiam os pratos debaixo da roupa que vestiam e saíam apressadamente. Recordo que no fim de servir o jantar, da baixela que eu tinha comprado para duzentas pessoas, já só restava um centro de mesa tão grande e tão pesado que ninguém o levou. Esse extraordinário êxito da louça das Calda numa festa de jornalistas foi, para mim uma lição. Há riquezas em Portugal que nós desconhecemos." [Página 15]

[Álbum de Memórias. 6.ª Década (Anos 70) II parte. O Tempo da Revolução. José Hermano Saraiva. Edição: O Sol é Essencial S.A. e António José Saraiva. ISBN 978-989-8120-06-9. 1.ª Edição: Julho de 2007. Tiragem: 27.500 Exemplares.]

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