Cavacos das Caldas
CAVACOS DAS CALDAS II

DICIONÁRIO GRÁFICO BORDALIANO

alguns livros, cerâmicas, belos gatos e algo mais...



sexta-feira, 12 de agosto de 2011

A Visita da Troika

Foram entrando um a um.
Três dignos cavalheiros, que depois de um certo acanhamento e dos cumprimentos da praxe, se acomodaram em redor da pequena mesa da minha livraria.
Um deles trazia uma pasta na mão. Uma daquelas pastas feitas à moda antiga, de design fora de moda, manufacturada à mão, de pele fininha, já um pouco sarrafada nos cantos. De aspecto vivido, de acordo com os muitos e muitos papéis que tinha transportado. E que segredos? Nunca viremos a sabê-lo; os segredos foram feitos para assim permanecerem.
O segundo, uma figura grandiosa, a impor respeito, trazia uma pasta de artista de onde iam caindo várias folhas desenhadas a crayon.

O terceiro homem, magro e um pouco encurvado, com a aba do chapéu caída obre os olhos, carregava uma maleta, com cantos de metal.

Sentaram-se. Cruzaram as pernas, acertando com cuidado o vinco das calças. Acenderam as suas cigarrilhas.


E logo no ar ficou a pairar um odor acre-doce e uma ténue névoa como que a esconder algo. Seria uma nuvem feita de sonhos a desfazerem-se em farrapos no ar?
Olharam em redor, quais generais a passar revista às tropas; nos seus rostos de linhas geométricas nem um sorriso traspassou.
Um deles, endireitou o cache-nez na cana do nariz abriu a pasta tirou um exemplar da “Correspondência de Fradique Mendes” e deixou-o em cima da mesa.



Um outro, após acariciar a ponta do bigode, tirou do bolso do colete bordado uma caneta, e da sua pasta de artista surgiu como que por magia um exemplar da “Lusa Bombochata”. Abriu o livro e na página de rosto desenhou com traços finos e rápidos a figura de um gato enroscado nas páginas do livro. Poisou este na mesa.
O terceiro homem tossicou várias vezes, pegou num dos livros que trazia na arca, abriu-o em determinada página e leu os seguintes versos:


“Bem sei que todas as mágoas
São como as mágoas que são
Parecidas com as águas
Que continuamente vão …”

“Segue o teu destino
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
Das árvores alheias.”

Também ele colocou o seu livro em cima da mesa.
Levantaram-se e saíram da livraria. Quando já iam do outro lado da rua, viraram-se para trás e disseram-me adeus. E nesse mesmo momento a brisa acariciou-me como se de um beijo se tratasse...
Fiquei a ver as suas figuras esfumarem-se ao longe.
Da visita da Troika, restaram-me três livros…

A Troika composta por Eça, Bordalo e Pessoa criados por Constantinos.

1 comentário:

Luis Eme disse...

que belas visitas.

também eu espero visitar-te daqui a umas horas, Isabel.